terça-feira, 25 de janeiro de 2011

CHUVA NA REGIÃO SERRANA JÁ MATOU MAIS QUE TERREMOTO DO CHILE

Pesquisador da Coppe, especialista em gerenciamento de risco, diz que destruição se assemelha à de um sismo ou de uma tsunami.

O ESTRAGO provocado pelas chuvas num bairro de Teresópolis, na Região Serrana do Rio: cenário parecido com o de um grande terremoto.

Por Isabela Bastos

A enxurrada que arrasou cidades da Região Serrana do Rio, há duas semanas, já provocou mais mortes que um dos terremotos de maior magnitude da história: o sismo de 8.8 graus na escala Richter, que atingiu o Chile em fevereiro do ano passado. Até a noite de segunda-feira, o número oficial de mortos na serra chegava a 817, três centenas a mais que a catástrofe do Chile (521). O número de desaparecidos também surpreende. No Chile, 56 corpos não foram encontrados. Na Região Serrana, segundo o Ministério Público, existem mais de 500 desaparecidos.

A quantidade de óbitos e o grau de devastação, sobretudo em Nova Friburgo, Teresópolis e Petrópolis, fazem com que a maior tragédia climática do Brasil seja equivalente a um terremoto, segundo especialistas e profissionais envolvidos nos resgates das vítimas das chuvas. Para o coordenador do Grupo de Análise de Risco Tecnológico e Ambiental da Coppe/UFRJ, Moacyr Duarte, que passou três dias nas cidades serranas, a enxurrada e os deslizamentos de terra formaram um cenário de terror somente comparável ao de fortes tremores de terra, como os ocorridos recentemente no Haiti e Chile.

— Ele se assemelha a um terremoto de grande magnitude ou a uma tsunami. Em Friburgo, há grandes núcleos habitados soterrados e ainda não explorados pelas equipes de resgate. Em Teresópolis, houve muitos deslizamentos, mas bairros inteiros foram varridos do mapa por enxurradas, que removeram os corpos de lugar, comprometendo seriamente as buscas — analisa Duarte.

Ressalvando que não era possível classificar o desastre da Região Serrana dentro da escala Richter, uma vez que a medição dos danos de um terremoto combina intensidade e distância do epicentro, Moacyr disse que, visualmente falando, a devastação na serra lembra a registrada no Haiti, onde um terremoto de 7 graus matou mais de 200 mil pessoas em 2009.

— No Haiti, o epicentro do sismo foi em área densamente habitada, e por isso houve tantas mortes. Mas havia trechos em que ainda se viam casas de pé. Há áreas na região serrana que não se vê mais nenhuma casa. No Chile, o epicentro do tremor foi no mar. Se tivesse sido em área habitada, estaríamos contando mortos aos milhares. É preciso relativizar a comparação, mas a devastação se assemelha — complementa.

Já o pesquisador do Observatório Sismológico da Universidade de Brasília (UnB), George Sand, diz que a devastação causada pelos temporais no Rio pode ser comparada com a provocada por um terremoto de classificação dez na antiga Escala Mercalli Modificada (MM), que mede a intensidade dos sismos a partir dos efeitos sobre as pessoas e as estruturas construídas e naturais. De acordo com o professor, essa classificação, que varia de um a 12, ainda é usada por especialistas, mas não costuma ser divulgada para não haver confusão com a escala Richter, que mede a magnitude dos sismos usando instrumentos.

Pela escala Mercalli Modificada, o tremor de nível um não é percebido pelas pessoas. Já o de nível 12, denominado de “cataclismo”, provoca a destruição total e modificação da topografia no local onde é registrado. O de nível dez é chamado de “destruidor”, por provocar alterações do relevo da região afetada, com a abertura de fendas no solo e corte de canalizações; destruição da maioria das estruturas em alvenaria e pontes; sérios danos em barragens, diques e aterros; grandes desmoronamentos de terrenos; e grandes volumes de água sendo arremessados contra as margens de canais.

— Os danos provocados nas cidades serranas, como escorregamentos de terra, desmoronamento de casas, desvios de rios e quedas de pontes, nos permitem fazer a classificação visual com base nessa escala. A chuva torrencial foi o nosso terremoto — afirma Sand.

Coordenador do Hospital de Campanha da Marinha montado em Nova Friburgo, o comandante Carlos Mesquita esteve entre os oficiais destacados para trabalhar no Chile depois do tremor do ano passado. Em sua opinião, a devastação na Região Serrana foi muito maior que a registrada na periferia de Santiago, onde uma unidade provisória da Marinha foi instalada.

— Vimos um hospital chileno achatado como se tivesse sido pisado por um gigante. Mas, aqui na serra, o dano é muito superior. Em partes de Santiago, nem parecia que tinha havido um terremoto. O nível de engajamento das pessoas para ajudar também é infinitamente maior aqui — disse Mesquita.

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