Será que um cirurgião-dentista e professor de odontologia daria certo no comando de um time de futebol? Deu. Foi assim no Botafogo, que há cinco anos passou a ser presidido pelo ex-professor da antiga Faculdade de Odontologia de Nova Friburgo (Fonf), hoje núcleo da Universidade Federal Fluminense (UFF) e coordenador do programa municipal de estímulo à saúde bucal “Nova Friburgo volta a sorrir”, Maurício Assumpção (foto), de 49 anos, que até então tinha no futebol apenas um hobby nas praias cariocas. Em palestra esta semana na retomada das edições do projeto ESA Seis e Meia, promovido pela Escola Superior de Advocacia e o núcleo regional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB Nova Friburgo), ele destacou como implantou um novo conceito de gestão no clube. O jeito empresarial de Maurício presidir o Botafogo de Futebol e Regatas atraiu a curiosidade dos que prestigiaram a discussão, que teve como tema “O Direito Desportivo e a Responsabilidade Social de um clube de futebol”. Mas foi mesmo o crescimento empresarial do alvinegro que tomou conta do debate, realizado no auditório da Academia Friburguense de Letras (AFL), com a participação do gerente jurídico do clube, Anibal Rouxinol, que enumerou as multifunções de sua equipe de advogados que dá sustentação legal a contratos de formação e imagem, compra e venda de jogadores e ações cíveis e trabalhistas.
Junto ainda aos presidentes da OAB, Carlos André Pedrazzi, e da AFL, Aécio Alves da Costa, o presidente do atual líder do Grupo A da Taça Rio demonstrou grande entusiasmo com a guinada do clube que acumulava dívidas superiores a R$ 40 milhões em 2008. “O primeiro passo foi implantar métodos modernos e tornar o Botafogo uma empresa de verdade. Não nos bastava mais alguns torcedores terem suas atividades durante o dia e na saída do trabalho passarem no clube para dar uma ajudinha voluntariamente. É óbvio que não conseguiam resolver nada. Foi preciso profissionalizar, escolher os melhores e pagar salários maiores que os de mercado para mantê-los a todo o tempo e com exclusividade no clube. Isso desagradou muita gente. Foi preciso dispensar alguns”, disse Maurício que montou uma diretoria executiva e outra de futebol, todos com seus vices e pessoal de apoio administrativo. “Cada setor um com vida própria, como acontece em qualquer empresa de médio e grande porte, mas com o mesmo objetivo: reerguer o Botafogo”, completou ele.
Através de convênios com universidades, jovens—e de preferência botafoguenses—foram selecionados para trabalhar e aprender no clube. O departamento de futebol, contudo, precisava de uma equipe própria e ganhou um núcleo jurídico exclusivo. Outra mudança primordial para revitalizar o clube foi a criação de um departamento de marketing que se encarregou de colocar o Botafogo na mídia. A dívida altíssima herdada ainda existe, mas Maurício Assumpção tenta reunir um grupo de torcedores e empresários interessados em comprá-la, mas para tanto é preciso negociações no mercado.
A formação de um elenco de base genuína
Depois de dar uma guinada administrativa no Botafogo, Maurício Assumpção investiu na “alma” de qualquer clube de futebol: o elenco e, para tanto, priorizou a formação de seus próprios jogadores. E a técnica deu certo. Atualmente 11 jogadores do profissional são oriundos da base. Os juniores também recebem atenção especial, pois podem ser lucrativos para o clube com bons resultados no campo ou até mesmo em futuras negociações. “Um jogador de porte médio que custa ao Botafogo mais ou menos R$ 4,5 mil por mês, pode ser negociado no mercado por até R$ 30 mil”, observou o presidente lembrando que outra vantagem de formar os jogadores na base é que eles se identificam mais com o clube, vestem a camisa de verdade. Isso tem sido prioridade nos últimos três anos no clube, que gasta R$ 2,5 milhões por ano com os salários dos jogadores. A previsão para esse ano é aumentar esse montante. O presidente da OAB Nova Friburgo, Carlos André Pedrazzi, destacou a importância de valorizar-se a prata da casa. “Falar do Botafogo hoje é falar de credibilidade de uma gestão discreta, sem pirotecnia, mas que dá resultado com transparência e investimentos também na advocacia”, observou.
Com o conceito de gestão implantado no administrativo e no futebol o Botafogo já colhe os frutos das mudanças em cifras. Com a sustentabilidade no clube fatura-se não só em patrocínios, cotas de TV, vendas de jogadores e mensalidades, mas também em negociações. No Mourisco, Zona Sul do Rio, uma churrascaria arcou com as despesas de reforma de um imóvel do clube avaliado em R$ 16 milhões e atualmente paga R$ 70 mil por mês de aluguel. Também se arrecada com um novo e moderno parque aquático compatível para competições internacionais, estacionamento e espaço para shows, sem contar a recuperação do complexo social General Severiano, com a transformação de um casarão histórico em centro cultural e o faturamento com o aluguel do estádio João Havelange, o Engenhão, para grandes eventos. “Assim cada núcleo gera renda e se autossustenta”, diz Maurício, que lançou recentemente a ideia de se criar um bloco com os grandes times do Rio, “Os Cariocas” para incrementar novas torcidas Brasil afora.
Extraído do jornal A VOZ DA SERRA, de 31-03-2012